quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
Baudolino, Umberto Eco
Esse é um daqueles que dói fechar a última página... Contada pelo próprio Baudolino ao historiador bizantino Nicetas, durante a invasão dos "bárbaros latinos" (cruzados) a Constantinopla , a história inicia quando ele era uma criança, numa terra escondida em meio a uma constante neblina, nos confins da Itália medieval.
Baudolino era um mentiroso por excelência e, graças à isso, foi adotado por Frederico, o Barba Ruiva, imperador do Sacro Império Romano Germânico (1152 a 1190). A partir daí, sua vida deslancha num emaranhado de mentiras que se tornam realidade. Baudolino, na adolescência, vai estudar em Paris e lá conhece alguns rapazes que serão seus amigos pelo resto de suas vidas, bem como seus companheiros na busca pelo Santo Graal ou Greal, como o autor o chama, e do lendário Reino do Preste (Padre) João, um reino cristão que deveria existir no extremo oriente do mundo, nas proximidades do paraíso terrestre.
Com seu dom para a mentira, e com o objetivo de engrandecer ainda mais seu pai adotivo, Baudolino manipula a realidade e consegue, incluisve, encontrar os corpos dos Reis Magos e canonizar Carlos Magno, para se ter uma idéia do que é a genialidade de Umberto Eco nessa história maravilhosa.
Baudolino é uma espécie de Forrest Gump da Idade Média. Com uma diferença: enquanto Forrest era um tolo, Baudolino é um espertalhão mentiroso.
A graça do livro está justamente aí: em ouvir uma história sem estar certo da idoneidade de quem a conta. De todos os fatos narrados, muitos são mentira e muitos são verdade, mas é impossível separa o joio do trigo.
Baudolino dá a impressão de ter sido escrito para provar uma das teses mais importantes de Eco: a obra aberta.
Na década de 60, quando o mundo das artes era sacudido por uma vanguarda pós-moderna, Eco escreveu um livro definindo o que ele chamou de Obra Aberta em oposição ao que ele chamou de discurso persuasivo, ou fechado.
O discurso persuasivo traz a mensagem pronta para o receptor. O leitor de um livro tem apenas o trabalho de descobrir o que o escritor pretendia com seu livro. Uma única leitura era a permitida.
A obra aberta revolucionava o sentido da arte forçando o receptor a ter participação ativa no processo de fruição. Assim, cada pessoa que lesse um livro ou ouvisse uma música deveria ter um entendimento próprio sobre seu significado. Já não havia mais certezas a serem desveladas. O próprio conceito de realidade é colocado em questão. Pela teoria da relatividade, cada observador teria sua própria interpretação de realidade, dependendo do ponto em que estivesse observando determinado fenômeno.
Da mesma forma, em Baudolino, realidade é o que o protagonista conta, mas ele pode estar mentindo e, assim, a realidade é relativizada. O leitor não deve confiar nem mesmo no narrador.
Mas não é necessário conhecer o conceito de obra aberta para gostar de Baudolino. Eco, como sempre, consegue transformar temas complicados (como a política medieval) em uma leitura deliciosa que envolve uma história policial, lendas medievais, uma expedição em busca do Santo Graal e até uma referência à Alexandria, cidade natal do escritor.
Simplemente um livro inesquecível, que prende a atenção, que nos faz viajar e dividir os sentimentos desse protagonista que mente sim, mas pelo bem de sua terra e daqueles que ama.Um livro para ler e reler e encontrar novos significados a cada nova leitura.
Puxa já me deparei com tantos "Baudolinos...
ResponderExcluirInfelizmente eu tenho um dom em atrair pessoas que gostam de mentir, se se acharem, de mentir para se engrandecer, como se isso me fizesse admirá-los...
Mau sabem que sou tão cético, desconfio de tudo e de todos...
Forte abraço!
Já tinha ouvido falar deste livro, mas nunca tive oportunidade em ler. Sua resenha me fez ficar curioso, quando der vou procurar sem falta.
ResponderExcluirA partir de amanhã estarei viajando então desde já fica meus votos de um excelente final de ano.
Grande abraço
Eu tenho esse livro aqui em casa e acho a leitura essencial, além de sensível. Seu post mostra bem a essência do livro. Parabéns pelo blog! já indiquei a vários amigos. abs
ResponderExcluirolá Evandro!!
ResponderExcluirvim aqui no seu blog por três motivos:
o primeiro é para agradecer sua visita ao meu! suas palavras me deixaram muito feliz, espero que volte sempre lá! :)
o segundo é para dizer que adorei sua crítica!
por ignorância, nunca tinha ouvido falar dessa obra... mas internet é boa por causa disso, encontramos coisas novas e expandimos nossa cultura, desde que entramos em lugares saudáveis e inteligentes, como o seu blog!
por fim, para desejar um feliz natal, com muita paz para você!! :)
um abraço
http://songsweetsong.blogspot.com/
Baudolino, deliciosamente bem descrito por você. Eu observo que a maneira como você descreve, tras uma carga de sentimento e adoração pelo que ta aboradando. A mentira é algo tão forte em algumas pesoas, que chegam a tal ponto que elas mesmas passam a viver suas mentiras como se fossem realidade. Parabens viu. Aproveito para agradecer o selo, as felicitações de feliz natal. Te desejo também tudo de bom e maravilhoso que o proximo ano possa lhe trazer. Bom natal.
ResponderExcluirSuas visitas são sempre refrescantes!
ResponderExcluirSua compreensão diante da época atual é, ao meu ver, correta.
Como cristã, espero que todos aqueles que compartilham da mesma crença possam realmente entender o sentido do Natal.
Que o seu Natal, como o meu, seja momento de reflexão e esperança!
Até mais!
Hoje não poderia ser outro comentário.
ResponderExcluirPasso para lhe desejar um Feliz Natal e que 2011
lhe traga muita paz, alegria e felicidades.
Abraço
William
www.tocadowilliam.com
Mais uma dica sua que anoto e vou atrás!...
ResponderExcluirBaudolino parece ter morado em minha cidade do coração: Baependi, terra de contadores de 'causos' e de alguns raros e saborosos mentirosos!
Quanto ao Natal também não sou Cristão, mas sou Natalino! risosss
Feliz Festas meu querido amigo!
E que 2011 seja maravilhoso!
"O que é a realidade perto da imaginação?"
ResponderExcluir(Calcanhar de Aquiles)
Sua resenha é um convite para conhecer essa obra de Humberto Eco. Seu post abre o apetite para a leitura, daí o "Sabor da Letra".
Ter encontrado um espaço como esse e um amigo generoso como você é um presente que ganhei nesse Natal.
Feliz Natal amigo.
Abração grande do amigo "Calcanhar" aqui.
Excelente resenha, já está anotado em minha infinita lista de leituras...
ResponderExcluirGrande abraço!
Como vai Evandro, tudo bom?
ResponderExcluirfeliz natal pra você tambem.
Excelente postagem, fiquei com vontade de ler tambem, legal essa visão sobre a idade média, ainda mais quando o personagem se articula com figuras de impacto como o imperador de constantinopla, o caso do "heroi" se pautar em mentiras da um aspecto alternativo ao que consideramos realidade ou não, depende do ponto de vista de quem ve. Como aquele cruel ministro de propaganda nazista disse uma vez, " uma mentira dita cem vezes torna-se uma verdade"
Grande postagem amigo, voltarei mais vezes
abraço!
Livro interessante...
ResponderExcluirPassando para te desejar um Feliz Natal!
Que delícia encontrar referência a Humberto Eco, quando estou relendo "Pêndulo de Foucaul"!
ResponderExcluirUm 2011 cheio desse fogo de criatividade sagitariano.
Lendo este post, imaginei Balduíno como o Chicó de O Auto da Compadecida. Adoro estes personagens e é muito difícil não se aventurar com eles.
ResponderExcluirbeijos