Não lembro se vi “Tudo Sobre Minha Mãe” no cinema ou quando foi lançado em VHS. O fato é que isso foi há quase onze anos e ainda assim sua lembrança é sempre forte o suficiente. Revi muitas vezes e considero uma obra prima do cinema.
Pedro Almodovar já era um diretor admirado nos anos 80, quando era mais conhecido pela irreverência e escracho, associado a um cinema “kitsch” que primava pelo senso de humor debochado e situações e personagens inusitados, sempre com a sexualidade em questão. Mas nos anos 90, o diretor se destacou por uma mudança no tom: suas histórias se tornaram melodramas mais sérios, o deboche deu lugar a uma sensibilidade mais apurada, as cores, embora sem perder sua identidade latina, mais sóbrias.
“Tudo Sobre Minha Mãe” é o grande filme dessa sua fase “madura”, muito embora seus filmes anterior (“Carne Tremula”, que acho muito bom) e posterior (“Fale com Ela”, que também acho obra-prima) a este, também tenham muitos admiradores. O feito maior do cineasta aqui talvez seja a incomparável capacidade de narrar uma trama pesada e cheia de ramificações quase apelativas (morte, doação de órgãos, prostituição, travestis, aborto, aids e drogas) numa síntese perfeita, longe do pieguismo, mas emocionalmente forte o suficiente para levar o espectador às lágrimas, característica essencial de todo bom melodrama.
Almodovar também é conhecido pelo seu talento em filmar mulheres e o universo feminino, e “Tudo Sobre Minha Mãe” é o seu ápice nesse sentido, numa homenagem à força da mulher com personagens femininos que sofrem durante todo o filme, mas que conseguem alguma dignidade e respeito através da união, compaixão e a vontade de viver e reafirmar a vida diante de tanto sofrimento. Uma das inúmeras qualidades do filme é não tentar despertar no espectador piedade por essas mulheres, posicionamento ético de Almodovar que ainda defende o perdão e o respeito às diferenças. É um filme que emociona até mesmo quando um personagem que fez tanto mal às protagonistas segura um bebê no colo, no que em outra obra poderia se tornar um acerto de contas dos mais vingativos.
Ajuda muito o elenco espetacular do filme, encabeçado por Cecilia Roth, uma das grandes atuações da década. Mas há espaço para todas as mulheres de Almodovar brilharem: a veterana Marisa Paredes, Penelope Cruz em início de carreira e a grande revelação Antonia San Juan, no papel do hilário travesti Agrado, que não perde o bom humor nem nas piores situações, resumindo um pouco algumas boas idéias do filme. É de Agrado, inclusive, uma das melhores frases do filme: “Você é mais autêntica quanto mais se parece com o que sonhou para si”.
“Tudo Sobre Minha Mãe” também se destaca pelo rigor técnico de Almodovar, sendo seu filme mais apurado até então. Da fotografia estupenda (com um vermelho dominante com função dramática no filme) à bela trilha sonora, tudo funciona numa unidade impressionante, que comprova o incrível domínio que o cineasta possui da linguagem cinematográfica.
Bom lembrar também como a trama se articula através da homenagem a outras obras de artes (algo com muito mais intensidade no filme seguinte, “Fale com Ela”), como a peça de Tenesse Williams “Um Bonde Chamado Desejo” e o clássico “A Malvada”, de onde Almodovar pega emprestado o título (“All About Eve” no original) e uma subtrama envolvendo o relacionamento entre as personagens de Roth e Paredes (antecipado pela bela imagem da foto acima).
Cinema de lágrimas da mais alta qualidade.
Rever? Nem assisti :/ rs Vou procurar esse fds na locadora :) Mas será que tem em DVD? Parece ser legal... Ótima postagem!
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