De que forma uma experiência traumática pode marcar a vida de uma pessoa e forjar sua personalidade? No surpreendente Rio Antigo, Confissões de um assassino da Belle Époque, o escritor Anatole Jelihovschi dá voz ao frio, calculista e manipulador Afonso, um sujeito arredio e fechado que tem prazer com a crueldade e se alimenta da dor e do sofrimento alheios. Uma sede de sangue construída por um episódio impactante: o assassinato da mãe pelo pai, que se matou logo em seguida ao homicídio. Dono de uma prosa elegante e fluida, o autor apresenta pelos olhos do protagonista a transformação de Afonso em serial killer a assombrar nos primeiros anos do século XX o Rio de Janeiro, testemunha e palco de seus crimes. Contrapondo a trajetória de um garoto fadado a "monstro" e o Rio sonhando ser a "Paris dos trópicos", em meio ao fervor da reforma urbana do prefeito Pereira Passos.
Trecho:
"Nehuma emoção guardo da vida. Nesse momento, em que o vazio dentro de mim se tornou maior do que a morte, nada restou capaz de refazer a ilusão da existência. Ao contrário, entrego-me inteiramente ao vácuo que cobre o céu e em cujo regaço minha vida desaparacerá. Vivi da mesma maneira que em breve morrerei; na mais completa indiferança a tudo, à exceção da volúpia de sangue.
Na miséria vivi, e onde não a encontrei, provoquei-a. Minha vida só existiu no sofrimento que causei às pessoas e no sangue que derramei."
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